sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Nas estepes da Ásia Central



Um dia - já lá vão alguns anos - perdi-me entre Almaty (antiga capital do Kazakhstan) e Bishkek (capital do Kyrgyzstan). Valerio (cidadão Kazakh de origem russa), meu guia, teve que escolher entre dois caminhos a seguir numa bifurcação em plena estepe sem qualquer orientação. Ficámos parados alguns minutos, o tempo necessário para decidir qual dos caminhos seria o certo. Era noite escura. Escuridão quase absoluta. Só tínhamos as estrelas do firmamento. Dei por mim a tentar agarrar aquelas estrelas que estavam connosco, muito próximas, naquela estepe imensa e infinita.


Apeteceu-me naquele momento repetir o que escreveu Nikolai Prjevalski (1839-1888):

Nos longínquos desertos da Ásia Central deixei algo de muito querido que a Europa não me pode devolver. Naquelas paragens cresce uma erva muito preciosa: a liberdade, liberdade selvagem, é certo, mas isenta de quaisquer obstáculos. Liberdade absoluta!”

"A erva de Prjevalski apodreceu e desapareceu com o herbicida soviético", escreveu Jean-Paul Roux.

Durante mais de 2000 anos a Ásia Central foi o único elo de ligação entre a Europa e a Ásia. Apesar de todas as vicissitudes da História, não só esta ligação não se rompeu como a Ásia Central não voltou as costas ao seu passado para adoptar um qualquer modelo de vida ocidental. Para quem se interessa e viaja pela Ásia Central, há que fazer abstracção dos períodos de ocupação chinesa e soviética e entrar no sonho. Os cavaleiros, as caravanas, os caçadores com águias e falcões continuam lá.

Países como o Uzbequistão e o Quirguistão ressuscitaram os seus heróis após terem proclamado a independência no início dos anos 90. Tamerlão (Amir Timur) e Manas assumem agora figuras de proa na história daqueles países reescrita depois do longo período de “esquecimento” forçado. Em contrapartida, outras figuras históricas e míticas cedem o seu lugar ou vêem o seu percurso descrito de forma diferente. É o caso de Genghis Khan e da influência mongol no imenso território do Turquestão e das figuras recentes do império soviético (Lenine, Estaline).

Sumptuosos monumentos continuam a partilhar o espaço com os ruidosos e coloridos mercados. Apesar de a maior parte dos países terem adoptado modelos de desenvolvimento tendo em vista o mundo moderno, a tradição não foi abandonada nem renunciada. É esta a magia subtil da Ásia Central que todos os que a visitam sentem, em especial ao admirar os espaços infinitos das suas estepes.


A Ásia Central é uma das grandes terras da civilização, um dos espaços privilegiados (e não há assim tantos com estas características) de onde surgiram, nasceram as grandes ideias, génios, ciências e artes. Foi na Ásia Central que nasceu o mazdeísmo, provavelmente a religião mais antiga ainda existente, com o seu reformador Zoroastro ou Zaratrusta, e que se perde na noite dos tempos. Foi também na Ásia Central que nasceu o budismo, que se desenvolveram os pensamentos indianos e gregos para dar origem à arte greco-budista. Foi na Ásia Central que viveram em perfeita harmonia os fiéis de todas as religiões universais.


Foi também na Ásia Central que nasceu al-Biruni, talvez o maior sábio do mundo muçulmano e Ibn Sina – Avicena – considerado o mestre incomparável e pai da medicina. Foi na Ásia Central que nasceu Ulug Beg, neto do grande Amir Timur (Tamerlão) e que foi sem dúvida o primeiro astrónomo dos tempos modernos. É na Ásia Central que se situam cidades (Samarcande, Bukhara, etc.) que outrora foram dos mais importantes centros da História da Humanidade. Heróis de guerras e de histórias épicas inesquecíveis, como Gengis Khan, Amir Timur, Babur, Manas viveram e conquistaram espaços e povos da Ásia Central.

O Uzbequistão celebrou em 2006, com grande pompa e circunstância o aniversário dos 670 anos do nascimento do grande herói Amir Timur, conhecido no ocidente como Tamerlão. O Quirguistão festejou em 1995 a memória do seu herói mítico Manas, recuando assim cerca de 1000 anos. Ambos assumem agora relevo de figuras de proa na história daqueles países reescrita depois do longo período de “esquecimento” forçado


Mas a Ásia Central ainda não desvendou todos os seus segredos. É esta a razão por que o estudo da História e dos povos da Ásia Central tem fontes inesgotáveis e alimenta o espírito insaciável de quem um dia por ela cair de amores.

No silêncio dos desertos monótonos da Ásia Central ouvem-se os primeiros acordes de uma encantadora canção russa. De longe, chega o som de cavalos e camelos que se aproximam e as notas melancólicas de uma melodia oriental.


Surge uma caravana da estepe infinita, escoltada por soldados russos, que prossegue a sua longa caminhada em segurança, protegida pelo impressionante aparato militar. A caravana afasta-se lentamente. Os cantos tranquilos dos vencedores e dos vencidos mistura-se harmoniosamente e os ecos permanecem no ar, enquanto a caravana desaparece.”

Este texto, extraído do folheto que acompanha o poema sinfónico “Na Ásia Central” de Alexandre Borodin, encomendado ao compositor em 1879 para comemorar o 25° aniversário da subida ao trono do Czar Alexandre II, impede-me de acrescentar o que quer que seja para descrever o que sente quem um dia atravessa as estepes da Ásia Central.




(Fotografias de J. Silva Rodrigues, exposições "Regards d'Asie Centrale" e "Na Rota da Seda")

2 comentários:

  1. estou fazendo um trabalho na escola sobre ásia central e esse trabalho tem que ser apresentado, estudo em escola publica do rio de janeiro e posso concordar com vc quem estuda e descobre a ásia central acaba se apaixonando por esse lugar

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  2. Poxa tenho que estudar para uma prova que cai esse assunto mas por incrivel que parçe eu nunca acho no google o que eu estou procurando... Gostaria muito de falar que u gostei da matéria mas nao é ezatamente isso que eu estou procurando.

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